Cinco improvisos ouro-pretanos

Dormideira (primeiro)

Na direção

onde você dorme

ao contrário

os milagres acontecem

os sinos dobram

de pingos em tempos

enquanto você dorme

a menina pula

na piscina azul

do arquiteto

e eu quieto

observo

servo do tempo

que me fresta

a piscina azul

do vento

paralisado

da noite mágica de Ouro Preto.

Atento!

A menina que pulou

na piscina do azul

do Grande Hotel de Niemeyer

foge na rua

pela madrugada

de um sábado

sem ilusão

que invento.

O sino dobra

às três.

Eu invés

não mais invento

aceito

azeito

afoito ainda

não me canso.

Um canto

reluz na água

azul

tremulante

da piscina.

Arquiteto.

Sala JK (segundo)

Aqui nesta sala,

onde o presidente

reuniu o séquito,

eu, hoje,

seco de apreensão,

escrevo

minha dor

de cinquenta voltas.

Presidente,

bossa renova

a saia da moça,

dança a valsa

no tardar

de ontem.

Me diga!

Que noite bela,

que presente, Marcela.

Ah! que cela

de onde ainda

não escapamos.

Amanhã sim.

Icônico (terceiro)

Um lugar

icônico

com as poltronas

precisas e rígidas

no espaldar

rangem

com maciez

tacos polidos

escamas de Peixes

com maciez nos passos

e economicamente

a vida

é gasta

onde a máquina

tange

formidavelmente

indiferentemente

e meu pânico

cessa.

Não ouço

gritos lá fora

nas ruas íngremes

de intriga

em Ouro Preto

outrora.

Cativo (quarto)

Escravo do tempo

escrevo

escasso

um passo

um traço

um terço

um senso

e solto

salto no abismo barroco

de suas encostas

o Itacolomi

logo ali

no retrovisor da vida

te olho e choro

cidade linda

cidade minha

cidade nossa.

Se não te amei

como devia

e via

as vias

veias e vivas.

Sempre

sempre aqui

viverei.

Linha (quinto)

O traço fluido do arquiteto,

sutil,

encontra

a luz

e a sombra

no umbral intenso

de uma ilusão

e de um concreto.

A vida é ilusão

e concretude.

Apenas esse resumo.