Que sonha e que mente - Poema em homenagem à poetisa Júlia Maria da Costa
Uma mulher com um fardo pesado,
inteligência aguçada,
beleza em olhos estrábicos
dos quais apenas se podem presumir
a direção para que tanto olham.
Uma menina que ainda não é mulher,
uma mulher que ainda é menina,
que sonha e que mente,
que voa, cai e levanta
na beira de uma praia.
Um homem bem mais velho,
um casarão enorme cheio de escravos,
festas, política e discussões,
não podem deixar feliz
um coração que nasceu para a sensibilidade
de uma paz discreta e com amor.
Sonha em poder amar um rosto pálido,
emoldurado por cabelos cacheados,
beijar mãos que são habilidosas no violão
que conseguiram tocar fundo seu coração.
Essa mulher só queria ter sido feliz,
ter dado uma chance a sua vida.
Queria ter aproveitado cada momento,
vivido de outra maneira,
tocado outras canções.
Não conheci essa mulher,
mas cegamente torci pela sua felicidade.
E até hoje, torço...
Para que em algum tempo,
em algum lugar perdido no espaço,
algum lugar secreto só para os apaixonados,
ela possa se perder
e mergulhar de cabeça
nos pequenos lábios que a seduziram.
E possa acariciar o rosto branco de seus sonhos
e ser feliz para sempre deitada na areia de uma praia,
com o homem que ama,
vivendo de poesia.
Essa mulher que hoje é nome de rua,
que pouca gente sabe da história,
que até pouco tempo tinha o corpo sepultado
no centro de uma praça,
chama-se Júlia Maria da Costa,
poetisa da ilha de São Francisco.