Esquerdina
Será que o Universo consegue ouvir todos
os meus gritos silenciosos?
Todas as minhas súplicas que me rasgam por dentro
e terminam com um ponto de interrogação?
Quando?
Esvazio os pulmões
para dar espaço aos novos desejos.
Hoje enterrei mais um
anseio de criança,
que era o de me perder na dança
enquanto sentia a luz do palco me aquecer
e não ouvia mais nada
além dos aplausos que eram sinceros.
Agora, meus pés e minhas mãos
estão roxos.
Minha voz desapareceu e circulou
pelo meu sangue até chegar à minha
mão esquerda,
ela é a única extremidade do meu corpo
que ainda resiste.
Meus olhos desistem e se fecham.
O azul do céu é minha última esperança
de que ainda pode haver mudança.
Entrego a ele o poder
de me fazer acreditar.
Quem sabe eu ainda possa voar
um dia.
Minhas costas já têm cicatrizes
e eu gosto de pensar que são
das asas que eu perdi.
Me retraí e me recolhi,
até que meu coração
tomasse o tamanho de todo o meu corpo.
Talvez a vida se esconda em cada ponto de interrogação.
Talvez cada dia a mais não seja apenas
mais um dia a menos.
Talvez todas as minhas dúvidas me carreguem
a algum lugar.
Ou talvez todas elas me transbordem até que
não me reste mais nada
além de um imenso e infinito desejo
de ser mais do que eu sou hoje.
Agora você conhece toda minha anatomia.