Breve amor

Certas coisas ainda não foram bem

explicitadas ao teu

formulário.

Certos códigos ainda se fazem

indecifráveis ao teu

coração.

Alguns arpejos nebulosos

conservam

os últimos fragmentos

da lareira

que acendemos com a fricção

de nossos pelos,

dos teus olhos semimortos

enxergo um fundo reflexo de fogo oculto,

que grita e nos chama atenção

para algo que não reparamos até hoje.

Um elemento esquisito paira sobre o ar

e preenche a lacuna existente entre nós -

éter, estranhamento, medo, paranoia, nostalgia, arrependimento?

Uma mistura de cada uma dessas coisas?

Seguimos, no entanto.

Em silêncio, a mente supondo casos irreais.

Não sei se escutas a mim

ou qualquer outro som do mundo,

mas aos poucos vem vindo o estrondo dos carros supersônicos,

sinos alarmantes, árvores cortadas,

pássaros solitários,

pedras chutadas ao vento, crianças amadurecidas,

batentes impiedosas, garças à procura de outras garças,

trens partindo,

a paixão galopando e deixando rastros pelo caminho.

Vem vindo as calças apertadas, rugas, cabelos brancos,

unhas encravadas, calcanhares rígidos, insuficiência respiratória,

cansaço físico, cansaço mental, esgotamento do ser.

Vem a chuva, enchentes, desastres e inconsequências

para varrer num segundo o que construímos a vida inteira.

O esquecimento nunca se esquece da gente.

Nada podemos fazer.

Nada podemos fazer, minha querida, senão

dançar o jogo das cordas invisíveis

e amar sem limites

enquanto não nos cortam

pelo pescoço.

Quero gastar o pouco tempo que me resta

segurando suas mãos e contemplando o fim do mundo...

Só tenho a ti

nesse momento e isso é tudo que necessito.