LEMBRANÇA
(ao som de dikanza e ngoma)
Aquela beleza sem par que agora reclina a cabeça
Com fineza
No peito do sujeito ao jeito de gazela —
Tenho a estranha impressão de já havê-la visto
Não sei de onde —
Se no Kalawenda*
Se no bairro do Kasenda*
Não me alembro ao certo
Talvez seja ainda ali naquelas bandas do Balamuka*
Onde ela brincou comigo
Aquela brincadeira de amor e namoro
À maneira por que brinca com ele
Aquela boniteza que agora repousa a cabeça
Com subtileza
No peito do sujeito ao jeito de gazela — eeeeeeh
Tenho a sensação de já havê-la visto noutrora
Repousando a cabeça no meu peito também
Só que não me alembro onde —
Suspeito ser lá nas redondezas do Kazenga*
Ou mesmo no Sambizanga*
Porque embora repousando no peito do sujeito
Ela está a jeito, olhando
Olhando-me furtivamente com um sorriso meloso
No canto da boca
Como quem ainda se deleita com os segredos
Da nossa antiga paixão (sou levado a pensar)
Entanto, mantenho-me espiando do lado de cá
Aproveitando dar-lhe umas piscadelas
De soslaio, vez em quando
E ela responde flertando comigo do lado de lá
Sem que ele se aperceba da nossa brincadeira
De amor e malandragem
Aquela lindeza que agora cativa-me inteiramente
Em sua delicadeza
Com lábios cheios de seiva
Docemente abertos assim —
Eu tenho a certeza de já havê-la visto, vez por outra
Em algum lugar —
Creio que é mesmo lá no Sambizanga*
Aliás, na Kalemba!*
Certamente na Kaleeemba!
Bem me alembro!
Só não faço mínima ideia de como ela
Tão bela e tão rara, oh Kazola —
Como tinha vindo parar no colo dum sujeito
Tão maroto assim
Aqui no bairro do Tunga Ngo?!*
*Bairros de Luanda (Angola).
Escrito em Kimbundu (Angola).
Tradução portuguesa do autor.