Poema à luz de vela

(à Daniele Ulbrich)

I

Piso bruto neste chão

De terra árida e céu escuro.

O vento me toca,

Trazendo um acre sabor na boca.

Penetrando nos lagos profundos

E nas entranhas do mundo,

Sincronizo com o seu palpitar oco,

Mas muito de meu gosto.

Como um quadro daquele tempo –

Meu e seu –

Tenho nossos momentos fotografados.

Estou sempre revendo-os

Semore relembro o que posso –

Ou o que quero.

Com estremo pesar –

Exceto quando estou triste –

Sei que tudo isto que passou

Não tem preço – nem volta.

Perece a vida, acha que isso me importa?

II

Penso pouco nesta vida

De dores amplas e mau-agouro.

Não entendo este meu estado,

Por que viver tão morto e

Tão fraco (e por demais humano?!)?!

Meus olhos pouco vêem.

Vejo apenas quem quero,

Vejo apenas seu rosto belo e

Seus pequenos olhos raros 332

Seus olhos pequeninos e verdes...

Que, de tão pequenos,

Me parecem tão negros,

Permanentemente.

E seus lábios,

Tão doces e sádicos, refletem

Minha inconsolável amargura:

Não saber se um dia irei toca-los.

Existe no mundo momento mais vão

E algo tão inusitado

Como o vento matinal tocando seus lábios molhados?

III

Que acabe com toda minha tristeza ardente

Este remorso vão!

Rói-me as veias para sempre

Este amargo coração.

Árvores da paisagem calma

À minha frente.

Disso, fica plena a alma.

IV

Nunca viver assim! Nunca viver num dia

Assim! De um sol assim!

Que me dera fosse tão fácil

Nunca viver assim!

E nestes pensamentos de angústia louca

Assim dos lábios a vida corre.

Me fazendo perder a pouca alegria

Que em minhas veias percorre todo o corpo.

Postos nos meus os seus olhos molhados,

E tocando nos seus os meus lábios gelados...

Saiba que tudo passará.

Mas chega de tanto lero-lero

Diga cinco frases

Que me alegro.

Ainda que “perca” todo o meu tempo

Vejo tão bela suscitar nos seus olhos, querida

A delícia da vida! A delícia da vida!