Minha fulô

Seu moço, sou cabôco, nascido e criado no mato,

No meio das quebradas da caatinga do meu sertão,

Numa humirde paioça de vara, enfincada no chão,

No pé de uma serra, todinha, inramada de cipó,

Pendurando verdes ramagem, fulôrida quinem um manto,

Espaiando um cheiro cheroso, pra tudo que é canto ,

Cum cacho de fulô se abrindo, cheio de butão;

Um nivoero di passarinho e beija fulô,

Tudo, fazendo aquela bunitesa naquele mundão.

Seu moço, as veis mi incuca, o mistero dá serra!

Pro baixo daquelas peda, no meio das ramage, minando,

Um ôio di agua azulzinha, e fria, barbuiando!

No meio daquele sertão, aonde a chuva quagi não cai!

Parece inté que Deus vive naquele lugar!..

Dá serra nois vê bem pertinho do zóio, O luar,

Alumiando a caatinga e todo o cerrado!

Só não alumia a tristeza, e o sofrimento,

Desce humirde coboco, cum sodade e desalento,

Sem mais alegria! Sem amor! Aperriado.

Seu moço, nessa vida, nada, é bonito, quando nois tá triste!

Tenho inté sirimonha de querer cumenta!,

Us meu zóio mina água, e logo cumeça a chorár,

E minha voiz saluça, e tampa tudinho na minha guela;

Voz micê, ói a minha paioça cuma ta triste e ôca!

Aqui, morava junto de eu, a fulô, minha cabôca,

A muié mái alegante que, meu zóio já viu!..,

Eu nunca fui tão feli cuma fui cum fulô!

Muié alegre, vivia cantando, seja lá onde for;

Mai, por cuipa du distino, a minha fulô sumiu.

Sai quagi doido, entre a caatinga, de riba abaixo,

Sem ter nem um siná, e nem um rasto quaiquer!

Fulô? Fulô? Adonde vozmicé tá muiér?..

Arresponda?...Venha cá me dar um cheiro, minha fulô!

Tudo calado!.. Aquele silenço triste, naquele mundão,

A minha voz indo e vortando cuma assombração,

Sem te nenhuma resposta da minha cabôca, fulô!

O luar já caindo nas matas! Escura estrada!

E eu, sozinho vortando, sem minha fulô amada,

Pá minha paioça bunita, e feia, sem minha fulô.

Tirei meu chapeu, mi ajueiei, e rezei:

Meu padinho ciço! Frei Daminão, mi potrejá!

Leve a minha reza pá minha fulô, adonde ela teja:

Fulô, voz micê vortando pra eu, lá na nossa paioça,

tudo vai ser mió! Cuma tá bunito o roçado!

Já choveu no certão, o chão já está moiado!

Prantei mio, fejão, macacheira e melancia,

cum um bambu, truxe da serra: água fresquinha, e boa,

Pá quando noi doi tive com calô, e atoa,

inche o estambo, tumar banho e arrefresca.

Fulô, eu fiz uma santa crui, lá no pé da serra,

no quintá, prantei um pé de ingasera,

Para toda manhã, o xexéu de bananeira,

vim pousar cantando, anunciando um novo dia!,

No manacá, cum um cipó, fiz um balanço,

Pa minha fulô, nas tarde sombria, no seu descanço

cantar as cantiga bonita e se balançar;

Cum as fulô branca do jarmim, nois vai pá santa crui,

Enfeitado, juntinho, jurá a nossa união!

A cantiga dos passarinho, vai ser a oração,

levada pela vento, para as oiça de Jesui.

Valmy
Enviado por Valmy em 10/05/2015
Reeditado em 29/07/2015
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