Insuficiência

Não, não suspire agora! Sinto algo estranho

É que quando você emudece meu peito implora

Será esse sopro de vida minha chama guarida?

É que é preciso pulmão pois eu sou viciado

Haja cigarro para teu enterro, é melhor não pensar

É tanto fardo... É tanto fardo...

Viver-te passou a ser meu dever, é coisa de sina

Nossos passos tão entrelaçados, percalços de mim

Quando você tropeça, dou um salto, abro os olhos

E ainda um tanto estupefato respiro falsamente...

Era tudo coisa de pesadelo, faça não, vacile não

É tanto medo... É tanto medo...

E que você não sabe, mas sou menino de rua

Já vi de padres nas encruzilhadas a prostitutas

Nas sacristias, a vida já me bateu um pouco

De murro em murro ainda faço calo, sou mesmo ruim

Não sabem eles, só você para me calar

É tanto desejar... É tanto desejar...

Vê se me escuta agora, não sou de tanto tentar

Errei duas ou três parece que você é a da vez

E é tanta agulha para afinar, tanta orquestra para reger

Basta um arfar teu e já sei o rumo meu, reaja!

Que o tempo é rude, a ruga agride, não posso nem piscar...

É tanta olheira... É tanta olheira...

Já vou indo embora, só um último aviso

Não sou dessas que olha para trás, só saio

Porta aberta, peito estufado, coração em pedaços

Faz um remendo de mim, me conserta, me concerta!

Faz sinfonia de mim, joga na cama, me ama, me usa!

É tanto queimar... É tanto queimar...

Antes de ir te deixo meu telefone, o sobrenome

Do nosso filho parecia até combinar, nossa sala de

Estar, estou por aqui, só ligar, moro no celibato

Quando quiser visitar tenho quarto, um pedaço de mim

Nesse papel de embrulhar...

Pode ligar... Deve ligar... Mal estou a respirar...

Gabriel Amorim 26/12/2014