Atalhos do céu
Atalhos do céu
Andávamos, nós dois, a repartir o augusto silêncio daquela montanha esquecida,
A alimentarmo-nos do alegre canto dos pássaros, a palmilhar recônditos atalhos do céu.
Teu rosto ofegante, corado, teu coração a bater assustado, teus deslumbrados olhos de mel;
Minha mão tua mão protegendo, em teu Ser meu Ser buscando impensada guarida.
Parece tudo tão novo; prospecto espelhos em teu ressonar mais tranqüilo, em nossos diálogos constantes.
Mapeio tua pele com cuidados de artífice, teus cabelos de graúna um a um penteando com os dedos;
Quero de ti um amar ainda não vivido, um beijo de sabor não provado, um domingo prenhe de cor, um futuro ausente de medo.
O bambuzal oculta a noite chegante; as turvas águas do rio, sob a ponte, escoam dúvidas e mágoas, o Amanhã já não está mais tão distante.
Há ainda resquícios de sombras pintando de nuvens a esmeralda de teu olhar, um esgar dolorido a marcar tua face, a conspurcar teu sorriso.
Não há razão para hiatos entre nós. Tu, com a cabeça em meu peito encostada, entre nós dois o teu gato enroscado, testemunha nosso amor sem igual.
Lembrei-me hoje, de outros poemas escritos; revivemos, cúmplices, reminiscências de outros amores proscritos, amei-te com vigor redobrado – fui O meu próprio rival.
Arranquei-te da cama outra vez, e trouxe-te prá mais perto de mim; a manhã, enxerida, vem chegando importuna, esta noite se foi; outras noites assim, inocentes, obscenas, são as noites de que mais eu preciso.
Talvez uma poesia não consiga expressar a grandeza do que sentimos, não consiga enquadrar corretamente a beleza do que vivemos. No entanto, sinto-me um homem pleno quando surpreendo o brilho feliz tomando conta de teu rosto, ainda respingado das águas com que te banhaste após o amor que fizemos.
São José dos Campos, madrugada de Domingo, um dia frio de meados de Maio de 2010.
João Bosco