Alma Gémea
No silêncio a leveza instala-se
O som ecoa com mais facilidade
A luz tem outros contornos
O reflexo ultrapassa os limites
A difracção é perfeita
As nuvens de luz são indescritíveis
E até o cinzento parece ter outra vida
Não é a solidão
É a ausência de inquietude
A paz interior de quem sorri
Não existem ataques nem defesas
Apenas o imediato e o real
Não são precisos jogos psicológicos
Ninguém vale mais do que ninguém
Somos todos erva do mesmo pasto
Bebemos todos da mesma seiva
E o sangue corre pelas veias
Com o silêncio de quem não está só
Na escuridão as ideias valorizam-se
Os temores crescem e tomam proporções
A vida passa pelos olhos num ápice
A racionalidade abandona-nos
Perde-se o falso equilíbrio
Anda-se às cegas e com risco de tombar
Os fantasmas apoderam-se
Os gigantes aparecem para lutar
Mas será só?
Com a ausência de luz vêem os sonhos
O desencadear de ideias e devaneios
A beleza de conseguir ultrapassar metas
Vencer obstáculos e ser maior
Mais do que se espera ou se consegue
Na escuridão somos quem quisermos ser
No vazio temos a angústia
De quem nada encontra senão terra
O céu deixa de existir e a crença perde-se
Tudo se esvai face á velocidade da luz
Os pensamentos não se processam
As imagens ficam difusas
A compreensão torna-se lenta
A sociedade afasta-se
E resistir á sobriedade é duro
Um pedaço de inferno perdido no solo
A réstia de desapontamento sentida
Denota a mais profunda rendição
Mas do vazio nada aparece
Aquilo com que pudemos contar persiste
Os valores permanecem como raízes
Os padrões são fiéis à sua imagem
No vazio restamos apenas nós
Na alma existe a essência
O pó da certeza que nos preenche
A mais pura noção de valores e de missão
Tudo o que queremos ser
Está contido na esfera dos sentires
Uma doação tão profunda quanto perturbadora
A verdade escondida de muitas palavras
Ou a mentira piedosa de muitos ensaios
Na alma temos todo o nosso teatro
Somos personagens e encarnamos
Num espaço e numa vida
Pertencemos ao mundo e a quem o detém
Somos únicos e não reprodutíveis
Consistimos e existimos no amor
Vivemos e rejubilamos na amizade
Perdemos e ganhamos com as primaveras
O silêncio
A escuridão
O vazio
São demonstrações
Meras divagações do cérebro
A realidade é que o Eu interior
É a força que move o Universo
Eu numa primeira abordagem
Tu de forma bilateral
Nós enquanto um todo
Porque a alma é tudo o que nos preenche
É o amor por nós mesmos
É a alegria de não esquecer
Que as ilhas solitárias
São poços infinitos
Não fosse a lágrima preencher o vazio
Da imensidão