MAIS UM DIA
Ensaiemos o canto da noite
no contra-luz dos sonhos inacessíveis
e escrevamos o grito de protesto
nas sombras grotescas dos nossos medos
Cheira a pedra inamovível a musgo moribundo
a cansaço dolorido a ausência de ambição
o silêncio que habita a cidade e dorme
no coração dos homens feridos de desimporte
embrulhados na transparência retocada
dos seus segredos
Nem os pássaros se atrevem a atravessar
a agonia dos jardins solitários a derrotar o vento
a apontar para a linha traçada no centro da estrada
seguindo apenas a cega rota do seu frágil voo
Tudo isto são congeminações simples palavras
para identificar as ilusões que vão nascendo
na vacuidade de cada nova madrugada
sempre arriscando a fantástica fantasia
de ir vencendo os arremedos da morte
somente para proclamar o sereno gozo
da vida
nem que seja por mais um dia.
José António Gonçalves
(inédito, 09.12.04)