DIVAGAÇÕES
Há muito o que ver na tua fala
Também há muito o que ouvir
No teu silêncio.
É quando chegas dia após dia
Ou disfarçando saudades
Depois de proposital ausência.
Não conto tempo
Nada sei de distâncias
Tu estás comigo, sempre.
É como se eu te gestasse
A cada vez que insinuas o teu chegar
E as dores do parto me invadem
Sem chegar o momento de parir.
Só sei do medo de te perder,
De tua voz emudecer,
Do teu esquecimento me envolver...
Ah, como tenho medo
Que tudo isto te leve de mim.
Não há poesia em te querer
Mas é tão poético
Quando a imaginação
Sem nenhuma razão
Te traz a mim!
A brevidade de tua passagem
Só ao orgasmo se compara
E que outra coisa poderia ser
Senão o que me toma, roda,
Remexe, revira, repousa,
E alguma vez retrai?
E eu insatisfeita
Quero mais e mais
E quando te procuro
Só as marcas de tua passagem
A me lembrar que
Mais uma vez
- promessa jamais cumprida
Abriste a porta e não entraste.
Fruto maduro no mais alto galho
Onde minha mão não alcança!
Há que se encarar de frente
O medo que tenho
Da certeza que és água
Que escorre entre meus dedos
Eu me debato, coisa inútil,
Tentando segurar-te.
Eu, lodo de pedra de praia
À mercê da onda
Que forma, deforma,
E volta sozinha ao mar.
Não há diferença no amanhã
Que se aproxima
É como se a noite apenas cobrisse
(para não molhar de garoa, talvez)
O que foi vivido hoje
O que foi copiado de tantas outras vezes.
Há muito de texto ensaiado
E nunca apresentado
Nesse meu querer/te querer/sem eu querer
Ou por eu querer
Em cena ando - eu atriz única
Dessa tragicomédia louca
Como cenário a fantasia e o sonho
Ah! A passagem para o real
Que não se faz
Tampouco eu acordo.
Há muito que lembrar
Que já te senti bem mais perto
Mas agora estás tão distante
Que o meu sonho tem a cor do passado.
Faz tanto tempo que tua voz
Tinha tons variados
Como uma pauta musical
Hoje é música de uma nota só.
Mas, ainda penso em ti
Como um náufrago pensa na praia!
Até no sangue de minhas veias
Existe um pouco de ti.
Como vês a posse é indevida
Mas aceita sem contestação.
Há muito chão a pisares
E tu escolheste o meu
Que fértil e adubado,
Fecundou as poucas sementes que jogaste.
Há muito que aprender com os frutos
Que não foram experimentados
Porque jamais colhidos
Assim também me sinto
Porque tua mão não fez a colheita
De tudo o que tu semeaste.
Mas que
Ainda assim germinou
Cresceu e virou amor.