SONHAR-TE
Publicado na coletânea Vôo Independente, edição de 2002, da associação Gaúcha dos Escritores Independentes.
Quando me disseste o que disseste,
Ouvi o que ouvi e calei.
Não chorei, não urrei, não bati com raiva meus punhos,
Nem pedi socorro.
Mas senti uma bruta dor aqui no peito, sufocando.
Não uma dor estranha, muitas dessas já senti;
Nenhuma dor extrema ao ponto de me matar.
Eu é que a matei em seco, engoli calado,
Morreu no peito, no duro, no fundo do peito
Quando dissestes o que eu não queria ouvir,
Ouvi quietinho, fiquei caldo, chorei sozinho.
Engoli em seco e toquei o barco prá frente.
Segui remando meu barco de tantos buracos,
Rombos mil, por onde escoaram meus sonhos,
Por onde também me inundei de tristeza.
Mas não afundei – é meu destino flutuar.
Logo encontrei a praia, quando quase náufrago.
Por isso estou ainda a flutuar no leito,
Seco leito, no caudal da solidão assoladora;
Onde não tem teu perfume nem teu mundo;
Onde não se ouve teu sorriso de adolescente
E onde não se vê teu jeito de criança contente.
Mas tem a lembrança de teu beijo molhado.
Aquele beijo que jamais provei,
Mas sonhei e no sonho me convenci,
Pois descobri que se não ganhei ainda,
Talvez seja só porque não mereci.
E Merecerei?
Um dia, talvez - Quem sabe? Não sei.
Mas se ganhasse esse beijo teu só uma vez,
Eu sei: nunca mais ia deixar de querer ganhar
Wilson do Amaral