"Tenho medo de mim"
Tenho medo de mim,
Quando me encontro diante de ti,
Quando os meus olhos pousam nos teus,
E te contam os meus segredos,
Mesmo que os tenha, há muito, em contenção.
Tenho medo de mim,
Quando a tua boca entreaberta
Balbucia o meu nome em silêncio,
E o meu corpo estremece,
Porque sopra em mim o vento do desejo.
Tenho medo de mim,
Quando a tua mão prende a minha,
E eu fujo, sorrateira,
Porque temo à partida ficar presa,
Pelo redemoinho que soltas do teu afecto, doce, ligeiro,
E porque receio que me queiras tirar o pedaço da alma,
Que trago inteiro e seguro,
Património só meu que a ninguém desejo entregar.
Tenho medo de mim,
Porque desconheço ainda o sentimento que nos liga,
Que nos prende um ao outro,
Se ele é fruto de um desatino dos sentidos,
Se é procedimento sério da razão,
Numa tentativa consciente de levar adiante
Um sentimento mais profundo.
Sei, que uma amizade assim,
Só entre almas gémeas pode acontecer,
Ou entre antípodas pode ganhar esta forma.
Tenho medo de mim,
Temo que seja uma tentativa de cauterizar feridas do passado.
Ou será que estou a dar consistência a um sentimento inusitado,
E a trazer mais verdade à consciência?
Será que nos movemos nesta conjuntura?
Deixemos, sem medo, o tempo falar ...
Beatriz Barroso