Monte Sereno
Quando o fogo que voa ferve o gelo que rasteja,
O Monte treme, balança, desequilibra,
E a neve desperta irritada.
A avalanche desce apressada,
Resmungando ao topo do monte
Impropérios à sua falta de elegância.
Não adianta ao monte pedir desculpas,
De nada serve seu desespero ante o tremor,
E não logra sequer se firmar sozinho
Pede então à neve que volte
Ao vento que se aquiete
Ao sol que esmoreça
E à terra que lhe sustente
Suplica a Jeová que aplaque sua ira
A Zeus que faça ninar a nuvem bruta
A Alá que não mais o mova
E a Cristo que lhe caminhe com bondade
Mas o gelo afiado continua a descer
Como um farelo seco em lágrimas
Que magoam a pele ao descer o rosto cortado.
A avalanche berra cada vez mais alto
Frenética e sempre com menos calma
A terra o tenta deglutir com gosto
O vento uiva acelerado de prazer
E o sol sorri largo em brasas
Quando vês, Monte, que te vais tornar pedregulho
Teu cume mira encosta abaixo para ver
Um velho solitário com uma pá a retirar a neve,
Um operário dedicado a apoiar encostas,
Um jardineiro paciente a acalmar teu solo com árvores.
Assim, Monte, vês que nunca estarás salvo das intempéries
Mas te sentes mais rocha do que nunca
Sabes, como poucos, minério só não faz montanha
E agora, vendo tuas pedras afagadas,
Podes curtir o calor confortante do sol,
O frescor aliviante da brisa,
A beleza em cobertor da neve
E o arrimo firme da terra.