Onde mora a Senhora Poesia? (uma reverência a Willy Zumblick)
Era madrugada ainda, amanhecia a existência,
quando o menino, de calças curtas e sacola a tiracolo,
levando um pedaço de pão, foi fazer o seu caminho.
É que ele queria saber onde ficava a morada
da Senhora Poesia.
Caminhava devagar, prestando atenção a tudo:
uma gota de orvalho,
uma galinha cacarejando,
uma criança chorando com dor de dente,
uma mulher dando adeus ao filho que partia.
Um pássaro voando
e, na distância, um sabiá cantando.
Mas o que achou mais bonito
foi ver o sol que nascia
naquela explosão de luz.
Tudo o que via, ia guardando na sacola a tiracolo.
Com cuidado especial, guardou as cores do sol
e achou que lá no horizonte é que morava a Senhora Poesia.
E quando muitos dias se foram ,
e muitas noites chegaram,
não encontrou o horizonte.
Então, da sacola que trazia como um fardo precioso,
o menino começou a retirar tudo o que nela guardara:
fragilidade, alegria, dor, despedida,
deslumbramento...
Guardou tudo bem guardado no coração,
menos as luzes do sol nascente,
que estas derramou na alma.
E com elas fez desenhos.
Pintou festas e tragédias,
o sagrado e o profano,
rosto de gente quase sem nome
e paisagens da cidade.
Pintou a noite em que Anita,
acorrentada na dor,
à insone luz de uma lanterna
peregrinava em meio à morte,
à procura de José, seu grande Amor.
E já crescido, o menino ainda lembrava cada coisa
que trouxera na sacola a tiracolo
e guardara no coração.
Foi então que descobriu,
em meio a profunda ternura,
que a Senhora Poesia,
mora bem perto da gente,
na explosão colorida de emoções,
que a alma vai derramando, em desenhos tão diversos,
nesta jornada da Vida.