CORPOS

Os corpos do meu corpo compartilham indiferenças, crendices diversas, autonomia, curas, febres e impaciência. Os corpos do meu corpo. Uns assimetrizam-se, alguns mergulham no caos e ambos aprendem na fé, no hábito, no hábito e no hábito. Os corpos do meu corpo nunca dormem juntos. Tem os que sonambúlam, os que pesadêlam-se e os que ensaiam a morte com suaves suspiros de um sono tranqüilo. Os corpos do meu corpo nunca aparecem no espelho, nem mesmo quando o corpo está triste e deixa cair uma tímida lágrima no canto esquerdo do seu olho vermelho. Os corpos do meu corpo são organismos, faculdades e minúsculas vidas finitas submersas na corrente infinita do lugar escuro da eternidade. Quando chegar o momento em que os corpos do meu corpo realizarem o sonho de tornarem-se também um só corpo, o meu corpo irá ao chão e anunciará em seu gélido e harmônico silêncio que agora, por ser apenas um único corpo, está morto, morto e morto.