VOZ CÁLIDA

VOZ CÁLIDA

A VOZ CÁLIDA Na boca do cego sou visga e afiada . Por trás do sonho do povo sou a dose torpe de coquetéis a pulsar nos corações tempestuosos das grandes metrópoles. Me sinto mais viva quando apareço na morte travestida de vida. Sou lágrima que não cessa mas que também nunca afoga. Sou como a alegria quando esgota e a mesma que não guarda no rosto a felicidade para quem a suporta. Sou qual os vermes a corroerem corpos em delírios E também o perfume que os debulham quando colhem Pelos campos lírios. Sou autofagia da fome na mesa posta dos homens e a fartura do tédio na mesa da gula também dos homens. Sou a droga injetável que ameniza a dor da morte contida na vida. Sou a chuva rala e ácida que ao gotejar na pele te incendeia mas que Ao anoitecer sob o teto de zinco logo te excita. Sou o idioma dos oprimidos onde o verbo pede exílio da reposta que falta onde também sou simplesmente o verso e o patético que a voz cálida e cilada atravessando todos os séculos mesmo cansada ainda te anuncia em forma de poesia transbordada nos dias.

Paulo de Medeiros