Me desculpe, amigo... Eu pisei em você. Eu te via todos os dias... e não percebia que você era gente. Achei que fosse uma poça d'água ou uma folha de outono... mas o inverno chegou. Me desculpe se pisei em você. Eu pensei que você fosse um pequeno guindaste com um gancho que me entregava coisas no alto da torre. Hoje descobri que você era uma mulher. E tinha sonhos atrasados, desfeitos ou novos. E que também teve medo da morte. Ou medo de que alguém que você ama demais, acabasse morrendo. Você tinha um medo terrível, incontrolável, de ficar só. Chá de maçã é o que passa dentro de mim e quando eu escrevo, o chá de maçã pode doer ou alegrar... Corroer os meus dedos. Me desculpe se eu me esbarrei ou te chutei no caminho, pensando que você era uma pedra ou uma lata ou uma merda seca. Pois hoje me dei conta de que você é um homem, e já é muito velho. Um bêbado, um sujeito esquecido. E todos os seus sonhos foram por água abaixo, muito tempo antes de todo este “AUÊ” que estamos vivendo e falando e falando, acontecer. Você nem entende esse alarde ao redor... você não aceita... Você é uma criança, tudo deveria ser do jeito que você quer... Você é um líder. Uma diva. Mataram você há milhares de anos atrás. Você foi um escravo ou um faraó. Uma ativista, uma cantora. Você era um tapete... E eu pisei em você. Eu entendo… Eu entendo… Eu entendo... Também me mataram muitas vezes, mas eu tive sorte. Eu tive amigos, e família, e eu era FORTE e tinha idade pra nascer. Outra vez, e outra vez, e outra vez. Moldar outro humano, da argila. Um Lego, uma receita de bolo; só pra poder voltar... e pisar nas pessoas de novo; acreditando que as areias de Guarajuba e as calçadas do Rio Vermelho eram as pedras do meu amor... juntadas e formando outro de mim, por inteiro.