Caleidoscópio
Sou chuva que cai e molha o chão
Filho e pai; irmão do meu irmão
Sou o cara e também coroa
Tempestade de verão e fria garoa
Sou plástico de madeira
Do espólio sou o troco
Das verdades, a verdadeira
O envelhecido tronco oco
O pagamento da fiança
A aba e o meio do chapéu
Sou a eterna lembrança
O sorriso de uma criança
O terreno acidentado
Sou o graveto molhado
No meio do fogaréu
Sou vinho velho em odre novo
Tradução de hieróglifo
Escrito em mandarim
Canção entoada no meio do povo
O princípio do meio, perto do fim
Sou a ambiciosa ambição
Desprovida de ganância
Ave que voa pisando no chão
Passado presente, futuro da infância
Sou animal manso, caseiro
Indomável e selvagem
A brasa, a centelha e o braseiro
Também a mira da miragem
Sou o exímio nadador
Que plana no bater das asas
A temida caça e o caçador
Criatura abissal de águas mais rasas
Sou o favorável contradizente
A energia da luz, a pequena semente
Sou o lobo de rubro capuz
Os dentes afiados da menina
A condução e aquele que conduz
A montanha no topo da colina
Sou a eloquente eloquência
Embriagado de sobriedade
Alquimia de velha ciência
Mentira dita pela verdade
Sou a jogada improvável
O cavalo, o bispo e o peão
Rainha presa na torre inviolável
Rei e tabuleiro, insígnia de leão
Sou nobre que mora na periferia
Vestido rasgado em festa de gala
Noite que brilha ao sol do meio-dia
Estante sem livros, o forro da mala
Sou do perdedor a vitória
Remédio caseiro feito em farmácia
O meio do fim, o verso da história
O ganho do malogro, a eficaz eficácia
Sou a coragem do guerreiro
Que foge do campo de batalha
As metades do inteiro
O assado cru, o fogo, a fornalha
Sou a sombra que guia o sol ao ocaso
Veste indecente e boca pudica
Manhã ao meio-dia, o pontual atraso
Aquele que vai e também o que fica
Sou pássaro que foge da armadilha
Da faca cega também sou o corte
Nativo estrangeiro perdido na ilha
Nordeste do sul, sudeste do norte
Do velho ferreiro sou a espada
Do monarca jovem também sou o manto
Não me conhece? Sou Netokof…
Agora de volta às terras do Recanto!
(Interação do querido amigo GSFreire)
A brisa tempestuosa e a tempestade serena
O solar na lua e a lua no sol
Os versos não rimados e a métrica rima
O sublime eufórico e a suave euforia...