TEMPO, TEMPO, TEMPO
Atirei a pedra contra o tempo
e quando ela voltou eu tinha me transformado
Estava mais velho
o rosto no espelho era diferente
e dois dentes haviam sido arrancados
(Para onde foram
meus fios de cabelo
nesta cabeça
que agora me é divergente?)
No virar dos ponteiros
o mundo estava alterado
a Terra havia girado
as sementes frutificadas
o semáforo aberto
o trânsito andado
e o Sol se achava
se pondo do outro lado
(Cadê o pássaro
que aqui sempre cantava
no parapeito da sacada?)
Hoje sou um ontem prolongado
demorado, comprido e esticado
e se o agora me é logo passado
no amanhã quando o alcanço
estou outra vez atrasado
(O amanhã sempre me foge
pro dia que lhe é seguinte.
e quando nele chego
ele havia de novo se mudado)
Para onde vai o futuro, não sei
talvez se abrigue no passado
em meio a tudo que em mim
não é feriado, apagado, esquecido
extinto, desaparecido ou finado
Tenho mais idades que aniversários
tenho mais infâncias que o menino
mais mocidades do que o rapaz
quantos adultos, nem sei mais
(O que serei depois
deixo aos meus velhos replicarem)
São cinco da tarde
e eu me tornei crepuscular
Faltam sete horas
para voltar a ser meia-noite
no tempo em hoje sou
um amontoado de horas
que já nem existem mais
Atirei a pedra contra o tempo
e quando voltou
eu tinha ido morar com meus pais