LABAREDAS DO CORAÇÃO
Meu canto é suculento, abusado, aguçado.
Fatiado com fervor, temperado de quero mais,
segue suas próprias pegadas sem pestanejar.
É canto sarado, cicatrizado, vasto,
por vezes vacila no andar, no entender, no acolher,
por vezes desafina, descabela, se amotina, se trinca.
Nesse canto solitário, parrudo, certeiro,
faço valer as vogais e consoantes da alma,
faço reinar o que tenho de mais desnudo, mais belo, mais meu.
Um dia esse canto perderá a cor, o brilho, o viço,
um dia esquecerá o nome, a matiz, o chão,
um dia acordará atônito, embaralhado, esgarçado.
Então só me restará o caminho de parar seu galope,
só me sobrará a partitura de desligar as labaredas do coração,
só me restará a certeza da feitura do lastro, do arremate, da missão.