INVISÍVEIS

Resido na ponta do cabo.

Vi as pedras do chão ao alto

e os homens que as ergueram.

E então sou o faroleiro,

não exatamente aquele

de carne e de esqueleto,

mas um que flutua e paira

sobre as meias-noites claras

e os meios-dias cinzentos.

Sou íntimo dos nevoeiros

e das cortinas de fumaça

— a neblina é minha casa

e o breu conduz a paleta.

A maresia traz o cheiro

que define os intervalos

do que logo não mais terá

nada do que tem o desenho

do agora e do momento,

pois o berinjela das quatro

é o roxo da alvorada

e o púrpura que rodeia

os bufos do mar violeta.

Anoto no meu alfarrábio,

de nuvem e de tempestade,

os mil cascos que já bateram

nas rochas postas em segredo

e bem ligeiros afundaram

suas madeiras e seus aços

entre as ondas saturadas

que empurram os afogados

às rotas do desfiladeiro

— todo azul de metileno.

Estou no farol apagado

que nunca esteve aceso.