FELICIDADES SURRADAS
A felicidade por vezes se diz morna,
cabisbaixa, amordaçada, franzina.
Parece terra surrada, desnorteada,
desleixada, desmaiada.
Mas é assim que ela se nutre,
se firma, se ensaia pra estrelar.
Felicidades fáceis de tocar são efêmeras,
frágeis, inconstantes, mancas até.
Felicidades fáceis de afagar são rasas,
sem tempero, sem arremate, sem viés.
Já aquelas que parecem tontas,
que parecem gastas, cansadas, capengas,
de missão cumprida,
guardam dentro de si néctares preciosos,
sumos cimentados, passos já ungidos, já benzidos.
São estas felicidades que sobrevivem ao caos,
às nevascas do medo, às ranhuras do desquerer-bem.
São estas felicidades já bambas, surradas, maltrapilhas,
que respingam afagos aos quatro ventos,
que dão curso ao rio maior,
que fazem a vida valer seu custo.