A MORTE DE VÊNUS
Ao emergir astuto — por Gaia
qual cativado — castrara Cronos
o pai, Urano, abscôndito em tocaia.
E assim lhe apossou o trono.
Ei-la! surge dos órgãos, musa; equórea,
do sêmen escumado, esta que era
sob pétalas e luz de cobre arbórea
o cair do inverno, o pôr da primavera.
Zéfiro a soprava, divina — qual
para vossa espádua em declínio,
Hora trouxera um manto floral
a cobrir-me o apetite ígneo.
Nascera casta, pura, bela, Vênus,
cabelos longos, seios pequenos.
Botticelli não lhe dera contraposto,
mas: cachos, curvas, tez, onde nasce,
nívea, par de vosso corpo aposto,
a graça límpida e o dulçor à face
— ''Oh! pudica Vênus, deusa da beleza,
Eis-me a vos obsecrar com mesura,
que quão mais me dispor formosura
mais pura e bela és vossa natureza.''
—''Se lhe cerro o peito e abro cicatriz,
logo deveras nobre é manter-se
calado a dar ouvido ao que esse
teu coração prosopopeico diz!''
—''Se meu corpo ao teu não queres unção,
não és meu porto seguro, meu recife,
manterei o celibato de Pigmaleão
E faço das minhas lágrimas teu esquife!''.