Incêndio
Estava na gênese de teu sorriso
brilhando como o fio da lâmina
que compôs o êxodo de tua vida,
Estava no olhar moribundo do ancião
mantido como monumento entulhado
nas calçadas e praças das cidades,
Esteve sempre na honra que é pressuposto
para o gozo de sangue dos fanáticos,
Estava na violência que é o mote escondido
pelo coração do Cristo que levas no peito,
Estava no teu senso de justiça
que é advento de tua sádica crueldade,
Estava nos gritos clamorosos por castidade
como desespero e contenção obsessiva
por tua transbordante perversidade,
Está na inveja de conviver e assistir
aqueles que estão dentro da religião da carne
e exalta o corpo, o sexo, com sobra de coragem
de enfrentar o mundo que te acovardou,
Esteve sempre nas vidas condenadas
pelo lugar que se nasce, pelo sexo que têm,
pela pele que se abre diariamente por séculos
se esvaindo o sangue, os sonhos, o amor,
e tudo que compõe a vida humana
dilacerada no rosto branco da barbárie,
e nesse momento nossa compaixão é sórdida,
despedaçada em assassinatos legalizados,
e a impotência desses privilegiados versos hipócritas
se calam diante da convivência com a morte
feita pela boca daqueles que sempre rogam por paz;
Eu rogo por incêndios.