ISAÍAS BRANDÃO
depois de por tudo em pratos limpos
chorou por três dias e três noites
todo o pranto guardado desde que
se viu como gente diante do espelho
e estando os fatos esclarecidos
da angústia nada sobrou além de paredes brancas
meias limpas, silêncio, flores nos vasos
nenhum inseto asqueroso para desequilibrar a cena
como é que agora com as contas em dia
ainda sentia falta do desconforto de ser e estar
tateando no escuro em busca do interruptor
implorando da vida a escassa água turva que gotejava
apertadas as mãos
voltou para casa e viu a si mesmo na televisão
como o medíocre herói de novela, tolo e pueril
capaz de nada senão amar à distância detrás de uma rosa
chorou por mais três dias e três noites
traído pelo coração que se dividia em preces distintas
uma pedindo forças para o bom combate
enquanto a outra divagava sobre prazeres e perdão
águas passadas. mentira.
atrás da língua resiste o gosto de sangue
no centro da mente habita a áspide
no coração ecoa o abismo.