BASTA

Chega, doutor, chega, repito

Eu não sou espécie para laboratório

Eu não sou nenhuma coisa rara

Para você me pesquisar

Não me veja como exótico

Não me persiga como caça

Não me use para se afirmar

Chega, doutor, eu grito

Já se vão quinhentos anos

De continuado sadismo

De tamanha exploração

Você que se diz civilizado

Você que se diz humano

Você que se diz cristão

Me deixa livre, doutor, exijo

Você já mentiu aos quatro cantos

Você já enriqueceu as minhas custas

Você já me destruiu demais

Você já provocou muitos prantos

Você já fez tantas putas

E deixou outros sem pais

Se convença, doutor, atenção

Não me interessa ser como você

Eu tenho referência... eu sei de mim

Posso me olhar orgulhosa

Não vou usar da sua covardia

Eu sei que você tem medo

Medo do chicote bater de volta

Não lhe peço nenhuma licença

Não impeça o meu caminho

Procure outros estudos para você

Porque não estuda sua pessoa

Dotada de tanta malícia

Mente venenosa e hipócrita

Que vive para mal me fazer?

Você que criou o céu e o inferno

Que para o céu vão os seus

E para o inferno vão os meus

Devolva todos os meus direitos

Você vai me aguentar aqui mesmo

Não sou peça para os seus museus.

(Recife, outubro, 1982)

Inaldete Pinheiro
Enviado por Inaldete Pinheiro em 01/04/2019
Código do texto: T6613110
Classificação de conteúdo: seguro