SNOOPY
Meu cachorro tem muitas vidas.
Tem a minha e a dele,
Tem a do poste parado
Que ilumina a rua escura
De árvores cheirando à casca,
Folhas e urina multicores.
Meu cachorro tem vários instantes
de muros, areia e pássaros,
Cava, enterra e canta,
Áspero, macio e feliz.
Tem motivos e lambidas,
Olhos que perseguem sonhos.
Tem, na volta, uma alegria
Contida na cauda erguida.
Meu cachorro tem muitas noivas,
Estrelas, formigas e grilos.
Cheira, brinca, olha e foge,
Brincando na tarde mansa.
Meu cachorro tem muitos nomes:
Filho - Preto - Carvoeiro,
Cada um é um pouco dele
E muito um pouco de mim.
Leva no focinho erguido
Uma enciclopédia de odores:
Carro de vidros abaixados,
Aroma de moitas vivas,
Moitas de memória largas,
Visitas que assovia,
Tesouros que ele enterra
Em tempo de ouvir risadas
E dores mal resolvidas.
Cor do carro, quando chegada,
Tristeza, quando partida,
A espera na sacada
Do abraço, o fiel amigo
Com olhos de cheirar comida
Corre, pula, late e canta
Uma canção de alegria.
E dentro de tanta vida
Guarda a minha com a sua
Desde que adotou-me, fiel,
Meu cachorrinho de rua,
De raça indeterminada,
Uma mistura feliz
De amor, carinho e ternura.
Não precisa pedigree
Nessa vida de aventura
Que brinca, pula e corre
Pela casa o dia inteiro
Pra depois dormir cansado,
Feliz por ter me encontrado,
Ter me adotado primeiro.