Ele não sabia mais

Assim que o dia veio

Beijando os paralelepípedos,

Ele sentou na calçada

Em cima do calor do sol

Ofegante feito um cão

Transpirando lágrimas

E

Revolta.

E pensava:

Puxa!

Que dia meu Deus,

Mais que dia

Muito louco

Pra ser de verdade.

O fedor do álcool exalava

Pelos poros,

Por baixo das unhas,

Pela medula,

Pelo dia miserável,

Pela loucura mecânica

De ter sido ninguém na vida.

Ele não sabia mais viver,

Não sabia mais olhar na face da lucidez,

E se envenenava

Assim como alguém envenena-se de refrigerantes.

Entre um passo e outro

O pranto,

O passado,

E parava pra chorar

Pirado.

Puxa vida!

Ufa!

Que dia meu Deus

Que dia

Aff!

Soluçava feito um covarde

E ensaiva um modo de morrer

Sem dor.

É preciso respirar.

É preciso tirar a dor

Que sangrava a alma

E derramava

Pelo semblante sombrio.

Ele olhava ao redor

E sabia

Que perdeu a sensibilidade

De ver,

De se amar,

De se apaixonar por si mesmo,

De acreditar,

De ser a mudança necessária,

De ser melhor,

De ser homem sensato

E forte,

Pronto a redenção

De um novo caminhar.

E caminhava esfregando o nariz

No chão,

Lambendo a calçada

Com vergonha de viver,

E pensava:

Puxa!

Que dia meu Deus

Que dia.

Aff!

Viver é cortar as asas

Dos sonhos

E tropeçar desnorteado.

Já não tinha saúde,

Já não tinha higiene,

Já não tinha amigos,

Já não tinha família.

E teria se quisesse.

Ele não sabia ser.

Meu Deus!

Sem Deus no coração

Ele não sabia,

Até que um dia

Quando a chuva lavava

Lembranças no caminho,

Ele dobrou os joelhos

A outro tipo de embriaguez,

E começou a entupir de verbos

O dia

A vida

Os transeuntes

E o verbo passou a ser

A sua vida

A sua casa _

A outra cilada.

As pessoas

Testemunhavam.

E parou pra orar:

Ufa!

Puxa

Vida que dia meu Deus

Que dia.

Aff!

Andava armado com o poder

Divino pelas

Noites mal feitas....

Andava

E pregava aos quatro ventos.

Puxa vida

Meu Deus

Dai a glória.

Aquilo crescia dentro dele

Feito fogo

E o homem se viciou em amar ao próximo,

Trocou a água pelo vinho e bebia sem dor,

Até que um dia

O homem trasbordou-se de amor

De delírio,

De alegria,

Pois tomou doses desmedidas

De fé,

De felicidade

De tal modo

Que o que era bom

Atravessou o exagero rumo

Ao nada.

E tudo que o universo oferece é mágica

Na vastidão.

E parou pra pensar:

Puxa vida

Que dia meu Deus

Que dia,

Riu até desatar um nó

E houve uma explosão

Desatando toda a dor.

aBel gOnçalves

aBel gOnçalves
Enviado por aBel gOnçalves em 18/04/2018
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