NESSE DIA, AS DESPEDIDAS
Gorjeia, estranho pássaro, um lamento
Entre canções tão raras.
Deixa ao cuidado de algum vento a queixa,
Havendo alguma, e deixa o ter por ganho
Uns jardins de setembro em seu fulgor –
Telas mais caras desdenharam desse truque fácil
Entre outros deslumbrados por promessa
Sem resgate – mas julgue, estranho pássaro, sim, julgue –
Faz de seu canto a lâmina mais lúcida
Discernindo das horas a agonia.
Golpeia a fronte da estação que hesita,
Sempre em seu rumo altivo.
Gaiola alguma em seu itinerário
Ofende a sua pressa.
Desce dos altos ramos e confere –
Hospício algum fermenta mais delírios,
As alucinações que a turba irmana.
Traz, pássaro dos ásperos cantares, aos incautos
E insanos a canção que os esquadrinhe.
Seja o profeta a resgatar alguns de vil destino –
Fomenta ouvidos cegos nos umbrais
Aos quais não chega esmola nem virtude.
Gemidos, gorgolejos e grunhidos
Suplicam na avenida.
Amamos nosso próprio grão maligno,
Onívoro e feliz –
De que nos serve agora um sonho vão?
Histéricas as vozes pelas praças,
Avenidas e becos, espectrais
Tumultuando as demandas nesse dia, as despedidas...
Desdenhemos o bando – é das calçadas
Sem brio que ainda assistimos a apoteoses do bizarro,
Fitamos cada carro em seus progressos.
Eis os que não o suportam, partem logo...
Gesticulamos, vão protesto, inútil
Sem peso ou conseqüência.
Notas de luz, cristais de meus fascínios
Outonam meus silêncios.
Depõe, pássaro, contra o que não dura.
Herdarei a fatura dos escombros
Antes que amar me faça humano, apenas.
Render por meus os firmamentos da estação da dor
É mínimo requinte – ou desespero
Sob marquises indignas, dolo, acinte a um grito azul.
Ergamos, pássaro, um minuto mudo
Acalentando os que não sofrem mais –
Ganhamos tanto! – esse ‘Aqui jaz’ é brando,
Se tanto, e necessário.
.