A LARVA

O mundo é uma teia que me prende

Aranhamente.

Soubessem a fobia que trago desse bicho

Entenderiam o meu pavor

Do tempo.

Cobram da criança

Maturidade

Que o adulto ainda não tem.

Exigem da bailarina

Força e leveza

Ou pena

Com a ponta dos pés

Em chumbo.

Há tanta lavoura por aí

Tanta comida, tanto banquete.

E enormidade de fome

Por aí.

Mas querem me convencer

De que a fome é culpa da boca.

Admiro o organismo social das abelhas.

Vejo disciplina, liberdade e coerência.

Mas o humano, destrambelhado,

Quer da colmeia somente a rainha

Vislumbra um reinado para si.

Operários constroem o dia

E ninguém quer ser operário.

Não importa criar as coisas

Mas, apenas, se delas apossar.

O dono do mundo nunca foi operário

É herdeiro fiel, desde o tataravô.

Dizem do cão o melhor amigo do homem

Fazem do homem o ideal inimigo de tudo.

Durante a Idade Média só o bispo era feliz

Mas até agora ninguém sabe

Onde está

O polo sul dos meus problemas.

Essencialmente o pão vem de um trigal antigo.

Antigamente ninguém passava manteiga no pão.

Bandido poderoso responde em liberdade:

Jamais é pego.

Preso fica aquele pássaro que procura alpiste.

Se há problema entre mim e o abismo:

Gravidade é solução!

A matemática e a matriz dos números complexos

A gramática coloca vírgulas sem lógica

A geografia muda diariamente

A história alivia o futuro.

O mundo é um formigueiro que me labirinta

Formigamente.

Determinam para o louco: sanidade

Da atriz: realidade

Cobram do manguezal aroma de coisa jovem

E querem que a muralha da China seja notada da lua

Imploram para aquilo que ninguém vê

Ouve

Ou

Toca

Mas não se conformam com

a

curvatura

do pescoço

da girafa.

Parece que quem nunca eu

Está satisfeito.

Nem eu, nem você.

Satisfação, quem quer dar?

Colocar a civilização no divã

Colherá do profundo do âmago humano

Que o repleto não é pleno.

Como pode então a humanidade estar farta?

Da teia da aranha

Eu me apanho

Diz-me senso comum: antes ali do que no formigueiro.

E se, do formigueiro, cair-me-ei então no buraco do cupim?

Artrópodes vão dominar o mundo.

Antes deles os protozoários.

O Império Romano do futuro cairá diante uma seita viral.

Genghis Khan nenhum é páreo para um motim bacteriano.

Há máfias de fungos que se alimentam da radiação em Chernobyl.

Contra a ultravioleta: óleo de copaíba.

Para respirar profundo: seiva de andiroba.

Evitar gripe? – a maçã está no pé!

Deve curar a gripe? – o limão pede para ser colhido.

Mas a publicidade presente na vista da toda cidade

Mostra que a dor engarrafada traz o placebo no vasilhame:

– maleita se trata é na prateleira!

O primeiro juiz da minha causa é a natureza.

O segundo juiz da minha causa é o destino.

Todo julgamento é moral

Quem elabora a técnica é um agente moral.

Quem interpreta a lei é um indigente moral.

Quem acusa tem moral

O acusado pode vir a ser um imoral.

Amoral,

Nunca.

O medo é um desafio.

Tipo cachaça que abre o apetite

Tipo passar fome sem arrombar cara feia

Tipo carranca que espanta golfinho.

A coragem é um abuso

Mas dela não disserto não.

O que me resta

É saber o caminho

Que me foge às teias

Indiferente

Ao que querem do meu caminho

Independente

Do desespero de andar sozinho.

Espirraram veneno no mundo

E o inseto que resiste

O aracnídeo que sobrevive

A drosófila que escapa

Encontram-se com a minhoca onipresente

No fim do túnel.

Enquanto já me tornei casulo

E espero sem pressa

Para virar alimento

Suculento

E encher a pança

De uma larva

Sem alma.