SAI DAQUI!
Gostaria de não ser só
– pois, até aqui, neguei-me a só ser.
E agora?
Passei pelo mar, os barcos atracaram.
Passei pela rua, as janelas fecharam.
Passei pelo meu tempo, o passado passou.
E agora?
É carnaval e ninguém festeja
Muita sonoridade e nenhum arpejo
Pouca solidariedade e ninguém: me vejo.
Socorro! – dirá pra quem se deu corda
É moda clamar por alguém
É foda viver por quem não vem,
Ainda que não: sei quem.
Gostaria de não ser só.
Estiagem nos bolinhos de chuva da vó.
Os países se cercam, os muros lamentam por evitarem,
Olhos que nem lacrimejam, raízes pros sonhos fincarem,
No desejo que a gente nem sente.
As esquadras jamais se rebelam, o ar se enche de felicidade
Vendida na mercearia,
Não diga jamais que ninguém merecia:
Há tanto motivo no mundo:
Para sorrir, para comemorar, para morrer,
Caminho demais pra quem quer se perder de saudade,
Saudade, saudade,
Saudade...
Palavra que me põe
No busto de ser só.
Saudade é um conceito
Saudade é uma tese, um tratado, um preceito, um rejeito
Uma receita pra lembrar que existe cavidade no peito.
Repara que a solidão nunca foi matéria prima para a rima
Mas, tudo bem, pois senão,
Bilac suspirava em gosto tão duvidoso
Clarice acordava e deixava o tempo ansioso
Rosa era flor de sertão que nem é sertão e nem flor alguma
Graciliano secou a fonte a botar na boca do poço a pluma
Quem nunca foi machadiano?
Que ironia haverá para além dos nossos danos?
Bom, Drummond é tão bom que nem me atrevo.
Rima com rima é como botar toda a sorte num trevo
Veja só como empobreceu o seu dia
Procurar rimas xucras na nuca da melancolia
Caso queira você euforia
Lembre-se: eu não desejo ser só.
É véspera de fim de carnaval.
Não me leve a mal: vá pra lá desfilar,
Vá e carregue a solidão que aqui mora
Dorme, hiberna, ancora, aliena.
Sai daqui que não quero ter pena
De quem não se liberta da obrigação de ser feliz:
Se você aqui ficou, até o fim,
Não me leve a mal,
Pois ficou
Foi porque quis.