Outono Desiludido

O outono desperta e abre enfim os olhos em todos os lugares,

E recordo quando tuas mãos macias e ávidas de carícias e afetos

Dormiram para tão longe de meus lábios e de meus mares,

E minha vida se tornou em um longo amanhecer sem faróis retos.

Quando eu te beijava e tudo fazia sentido nessa vida rude sem calma,

Você me acordava cantando músicas dos Beatles, pulava na cama

E me dizia: “sou teu solo, teu sol, e tu és o meu céu e a minha alma”;

E ao me sorrir todas as trevas e medos em meu ser eram expurgados.

Ainda ouço a tua pele acariciar e frutificar êxtases em meu árido ser,

Ainda vejo a ofegante respiração de tua serenidade e brincadeiras

Que peregrinavam na cozinha, na sala, no jardim com as tuas flores;

E o que restou? Um álbum de mentiras que cospe em minhas dores.

Foste embora em uma simples manhã de outono sem dizer nada,

Eu ainda dormia enquanto guardavas algumas roupas em uma mala,

Eu te sonhava enquanto saíste pela porta e fostes até a rodoviária,

E ao acordar eu senti que um poço negro crescia em minha madrugada

E queimava as imagens de teu lindo olhar tão cheio de horizontes,

E esquartejava todos os momentos de risos, de esperanças e de fontes

Que havíamos construído, vividos; os instantes de ternuras e afagos

Se afogaram em meu coração antes mesmo de me levantar da cama.

Queria de novo colher as tuas lágrimas e abraçar em ti novos sorrisos,

Queria acariciar os teus cabelos e beijar os teus beijos amigos;

Queria de novo abrir a porta do quarto e ver-te feliz na cama;

E sentir todo aquele fogo de viver derramado a quem tanto ama.

Anos se desfaleceram e nunca mais te encontrei e nem a mim mesmo.

Não sei por que me abandonaste e só me deixou uma corda e tal mundo:

Tudo solitário e perdido quanto nossa efêmera e vã fé no amor e na vida

O outono de novo desperta com tantas paisagens alegres e feridas.

Mas a dor não foge de minhas raízes, seivas, flores e de meus ramos;

A tristeza e a desilusão cavam covas às escondidas enquanto lutamos,

Um som febril de querer acreditar na felicidade ainda ecoa dos sinos

Perdidos que rezam em nossas iludidas almas enganadas pelos destinos.

Gilliard Alves
Enviado por Gilliard Alves em 02/07/2016
Reeditado em 02/07/2016
Código do texto: T5684898
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