Tangorilla

Os passos do tango

Mostram como nos afastamos

Dos humanos

E viramos orangotangos

Gustavo canta a vida

A emoção

Voz cálida e límpida dos uruguaios

Os dançarinos rasgam, arrastam a praça

Entrelaçam as pernas

Entrelaçam as vidas

Entrelaçam a saúde e a invalidez

Laçam a luz e a escuridão

A vastidão de sentidos

Entre a calma e a loucura

Entre as palmas, muitas palmas

Que elevam a saudade

A cada beijo não dado

De cada vontade não cumprida

Que fazem falta agora

E que serão lembradas até a hora de morrer

Toca Gustavo

Toca para que as pernas da dançarina morena

Que são serpentes

Entrelacem a sua preza até devorá-la

Cruzam todo o tempo

O homem é um só um brinquedo

Uma preza

A morte é melhor ser vivida a dois

Difícil final

E a bailarina continua a traçar

As suas pernas duas ninjas

Que num bruto arpejo faz tudo cessar

Para voltarmos a esta pobre realidade

Sem a tragédia do tango

Sem a sensualidade ofídica

Em que todos morremos

E esqueceram de nos enterrar

Montevideo 2/04/2016