Poema de todas as coisas
e você
que não conhece o mar
e nem o brilho do sol refletindo nas ondas
e não conhece as montanhas
e o sol que se espreme no meio delas
e não conhece a neve
e o sol que se ausenta (ou se traveste de branco)
e não conhece os campos de trigo
e o sol que parece roubar sua cor pra ser sol
e não conhece a floresta amazônica
e o sol que receoso só entra pelas frestas
e não conhece os rituais religiosos de tribos já mortas
e o sol que era deus ou era alá ou era tupã
e não conhece a itália e não conhece a frança
e o sol que eles transformam em arte
e não conhece o norte do brasil,
e não conhece o sul do brasil
e o sol que eles transformam em arte,
mesmo forte, mesmo fraco
e não conhece o "progresso"
e o sol que transformam em produto
e não conhece o capital
e o sol que transformam em lucro
e não conhece a muralha da china
e nem sol que a faz parecer um brinquedo
e não conheceu o muro de berlim
e o sol que a contragosto se dividia em dois
e não conheceu o campo de concentração de auschwitz
e o sol que parecia não chegar
e não conheceu a tentativa de fuga dos romanov
e o sol que apagou pro czar e anastasia
e não conheceu cleópatra
pra quem até o sol se curvou
e não conheceu a idade média
e o sol engolido pela peste negra
e não conheceu o navio negreiro
onde até o sol era privado de entrar
e não conheceu os milicos
e os sóis que foram perseguidos com o nome de vladimir
e não conheceu a guilhotina
e o sol que os pobres ergueram
e não conhece o órgão que pulsa
que bombeia o sangue e espalha o sangue
e não conhece o órgão que pulsa
que bombardeia, que espalha sangue
e o sol que pulsa para o amor, para o delírio e para o massacre
você não conhece nada disso
a menos que olhe
e enxergue o próprio sangue
e enxergue a própria carne
e enxergue a própria imagem
no quebra-cabeça chamado mundo
e o seu poder para completá-lo
bagunçá-lo
e destruí-lo