Reflexões

Em toda presença – a mesma solidão

Em todo abraço – a mesma distância

Em toda palavra – o mesmo silêncio

Em toda verdade – o mesmo engano

Suspensos no abismo do mundo

De um lado a inexpressão

Do outro, o lamento, a indecisão

Uma cela invisível, adornada de aflição

Esvazia as minhas palavras

E as condena à desilusão

Exila as minhas vivências

E as condena à incompreensão

Como dizem pouco as palavras

No exprimir qualquer profundeza

Entre o meu pensar e o teu entender

Entre o meu dizer e o teu ouvir

Jaz eterno o abismo do erro

Sobre uma ponte de símbolos

De insondáveis realidades

Mais de um tolo continua a sonhar

Que algo real é capaz de mudar

Esta tênue superfície do pensar

Do falar, do sentir e do sonhar

Como alheia a mim mesma

E com a crueldade de ser honesta

Corto superfícies e máscaras

Desvendo a verdade sem máculas

E olhando no abismo

Envolto pelo silêncio

Reencontro a profundeza

Reencontro minha morada

Vejo além da alma que há em mim

Com precisão míope agora posso ver

O que nenhuma palavra faz compreender

Descarnada a superfície de tudo

Vejo todo valor desvanecer

A consciência do nada

Vem a mim como uma vertigem

Me assalta um desalento indizível

Um desespero sufocante

Sou prisioneira de uma angústia

Plena de desprezo mudo

Como suspenso no vácuo

Como se a vida fosse esse vácuo...

Lucidez insuportável

Que parte meu pensamento

Oprime minha consciência

Zomba de minha esperança

Escarnece meus sonhos

Desfaz minhas promessas

Me esmaga com seu peso

Me infecta com seu amargor

Pensar-se assim é inumano

Uma indecência amoral

Uma existência impessoal

Em pessoa, cruel e imoral

Dentro deste teatro triste da vida

Entre a superfície e a profundeza

Vejo-me entre a máscara e o vazio

Como um fantoche oco, sombrio

Que sofre por ser eu mesma

Ao mesmo tempo em que ri

Ao pensar em tudo que vivi...

Francis Faria
Enviado por Francis Faria em 24/06/2007
Código do texto: T539279