A PRIMEIRA PRIMAVERA

A semana foi dura.

Se todas as palavras que digo fossem tão vazias

Nem mereciam respostas.

Quase sempre não merecem.

A semana foi dura.

E aí me vens com o sorriso da semana seguinte.

Como pode, tempo meu,

Como pode?

Arranjaste suspiros de onde?

As tuas forças: em que mundo se inspiram?

Pudesse eu ter força nas palavras vazias,

Ladainhas de tragédia nenhuma,

Dramalhão antimelódico,

Eu teria tragado as tuas forças para mim.

Tu me sufocas, sabia? Sufoca o ar que já perdi,

Por isso ainda o sinto, por isso ainda respiro.

A semana foi dura.

Com que me cravas um sorriso desse em meu peito, menina?

Trás de quando esses olhos cheios de olhares únicos?

Não disseste uma só palavra do que te sofres.

E ainda assim apenas me ofereceste alegria.

Como pode, tempo meu, como pode?

Nem soubeste colher amoras sem dar na vista de quem passa

Tu me derrubas, sabia? E tombado, assim, aprendo o poder de

Levantar: impulso que jamais conhecia.

Tens, em meus ombros, a saudade que trago

Óbvio então: se aqui há ombros, os colchões são teus.

Durma estes sonhos, princesa menina,

Durma que eu te velo. E é aí que me sufoco. E é quando posso respirar.

Já pensaste tu se inventas de partir e me devolves então o ar?

– aí fungo a atmosfera que sempre me afogou.

Mantenha-me em sufoco. Só assim eu posso voar.

A semana foi dura.

Começou dura. Terminou insana.

E por que não falar no primeiro dia da primavera?

– que flores foram aquelas, menina-sonho?

Por que me trouxeste o jardim de setembro inteiro,

Se eu ainda nem me havia retirado do inverno retrasado?

Não estava, eu, preparado!

E derramaste tu, sobre mim, todas as primaveras que hesitei por não as tê-las observado!

Como são lindas as flores!

Que formidável é o início de uma doce primavera!

A semana foi dura.

E pouco fiz para que te aliviasse.

Mas vens tu com outra proposta de sonho

E me ensinas a catar as flores que me entornaste como a um balde despejado

E eu cato pétala por pétala para ver se o tempo se afrouxa

Para ver se ainda dá tempo

De nos abraçarmos até a próxima primavera.

Tu me ensinas tanto da vida.

Tu me incluis em uma lógica tão outra, tão próxima, tão viva,

E me fazes com esse sorriso

E me tens com esses olhos.

Tão parca é a nossa aventura se o amor não nos toca.

E aí, como sabes tu, me vens com flores, sorrisos, olhares e força,

E o ar, e o impulso, e a estação dos sentidos,

E repouso tão livre e refeito,

Mal sabes tu o efeito do poder que possuis

Mal sabes tu!

De que é feito o sonho, ando aqui me perguntando.

– a primavera eu já descobri.

De que é feito o futuro?, pergunta que não cessa no instante.

– o amor eu já descobri.

A semana foi dura.

A vida às vezes é dura.

E, mesmo sofrendo, ainda consegues tu me mostrar que há leveza.

Pois sabes conter a dureza quando entregas a primavera que guardas em segredo.

Não sei quantas vezes deixaste de oculta-lo

Apenas posso dizer que há flores onde piso, naquilo que penso, no lugar em que estou.

Abriremos outras semanas, até que o calendário nunca dê conta.

E que todas as semanas sejam primaveris.

Para que nunca colham as flores que colocas em minha vida

E que eu possa ser somente um jardim.

Um canteiro. Um vaso.

Um xaxim.

Para que se possam cultivar teus sorrisos

E os olhares que te brotas a mim.