Marioneta
Numa ampulheta de cristal fino
escorro-me etérea em gestos títeres,
premeditados, demorados,
desabitados.
Vazios.
Marioneta. Não mais que isso.
As palavras não me bastam, não me saciam,
não me acalmam a dor da alma,
casta.
A palavra está gasta
na boca seca, gretada, da terra revolta
em espera da semente do beijo da tua boca.
Mordo na tonsura imperfeita, no golpe à navalhada,
as horas mortas em que se escoa o corpo,
no sono de quem morre falando baixinho,
o teu nome.
No acordar já morta no lençol vazio
e, sem que deseje, madrugo viva
na palavra triste,
na seiva reavivada
em sombras de horizontes longínquos.
Contra os sonhos, encontro os sonhos;
Contra o medo, encontro medo maior,
neste caminho em chamas em que me disputo
à vontade de me fundir negra na cor do luto.
Neste caminho devoluto em que me perdi de mim,
em que mais não sou do que
deambulação sonâmbula
em busca da paz
em busca da parte
que pressinto exista num riso inaugurado
na comunhão do homem e da sua obra.
Eu sou a obra. Tu o meu fim.