Venial
Euna Britto de Oliveira
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Já houve dias em que desejei
E cumpri a vontade
De pregar rendas finas
Em cambraia de linho
Ou em opala pele-de-ovo
E de fazer nervuras...
Meus nervos já gostaram dessas finuras.
É mais difícil suportar o benefício do que o sacrifício.
Do sacrifício, ninguém tem inveja.
Já do benefício...
Ao beneficiado, há muitos que o alvejam!...
Se fosse pecado, teria sido venial,
Mas não tirei a muda da trepadeira africana
Que me tentava, com tantas florzinhas amarelas!...
Respeitei a grade da casa alheia,
De onde elas despencavam...
Um mês depois,
Não resisti às flores lilases do pé de unha-de-vaca,
Árvore da esquina da nossa rua.
Colhi algumas,
Parecidíssimas com orquídeas!...
Se a casa fica melhor com o seu perfume suave
Cheirando a sabonete novo,
E sua forma de ave...
Que importa um mês de atraso a caminho da perfeição
Para quem já esperou séculos?...
A bananeira plantada à beira do muro,
Para os donos do lote – a fruta.
Para os vizinhos – as palhas secas
E as folhas rasgadas,
Como bandeiras do que já foi paz...
Não é gentil!
Que ao menos se limpem as folhas secas das bananeiras...
As que já deram cacho não vão produzir mais.
Primeiro, eu salvo as flores.
Depois, as flores me salvam.
E mesmo que não me salvem,
Ajudam-me!
O cipó de flor amarela
Com que a menina não brincou de coroar
Ficou jogado por terra,
Resistindo ao descuidado...
A flor vermelha do mulungu,
Muito bonita,
À beira da estrada Rio-Bahia...
A penca de rosas brancas
Com que não faço chá,
Para mim, basta cheirar...
A flor da sempre-viva,
De todas as cores,
De todas as vidas!...
Só vendo o tamanho do pedaço de miolo de pão
Que o passarinho marron deu conta
De arrastar com o bico!...
Quando penso que não,
Um outro voou com um pedaço maior ainda!...
Não sei que grande amor os motivava...
Fome própria é que não era...