NA MÉDIA
Fosse o fogo que me toca o motivo de minha ardência
O equinócio seria em agosto.
Hoje cultuam o milionário
Hoje adoram o que nega a razão
Hoje um corvo bravo dá rasante sobre as nossas cabeças
Belisca a minha nuca, bica a sua memória,
Agarra com a garra afiada o tempo que ninguém viveu
Transforma-o em cadáver
Arranca do cadáver a carne-viva
Estamos todos quase mortos no dia do nosso último aniversário.
Cultuar a riqueza, aquela que forjamos e nos retiram em seguida,
Adorar o ouro que de nós nos alienam,
É como festejar pela nossa carniça na boca do corvo.
Vejo, de repente, sujeitos aos montes,
Que se orgulham por pertencerem à média
E defendem com fé a classe...
E cultuam a riqueza
Que jamais terão.
Riqueza que nos arrancam
Antes mesmo de a verdade bastar.
Orgulham-se, médios,
De um jeito tão fácil
Como seria então o fácil um jeito exclusivo
Para se portar.
Fosse o fogo que me atiça,
Mas não, antes ainda falo das coisas severas,
Dizem da burrice por sua superficialidade,
Mas não! – burrice é o profundo que há!
O modo insensato da mediocridade,
O gesto corado nas mãos do passado
Uma vez que o futuro seja máquina
Futuro humano então não há!
O culpado será sempre o outro
Mas por nossa isenção?
Mas por virarmos as costas?
Mas por que somos corretos?
- o corretivo, onde está?
Que me amarrem no poste de Joana D’arc.
Que o arco que então nos triunfa seja o máximo que trago na fé
A fé no acaso
A fé no descaso
Fosse o fogo que me arde uma chama,
O poder de Nero me viria tão raso
Incendiaria o Atlântico, o Amazonas, o Nilo, o Mediterrâneo
Faria cachoeiras de lava
Mas jamais cairia em armadilhas. Jamais queimaria a esperança.
Desse jeito tão mediano eu não faço.