Imperfeição
Vamos blindar as janelas, vedar as portas, trancar os portões.
Vamos esquecer das flores vivas, das nuvens fartas, do céu de imensidão.
Vamos brincar que tudo passou como só o passado passa
E fingir que não escrevemos o livro, lemos a história e imaginamos o filme.
Vamos nos divertir com a metade das cartas,
Com a garrafa quase vazia
Com a cara quase lavada.
Vamos fazer de conta que fazer de conta é possível
Que equacionar e diagramar a emoção é cabível
Que dormir de olhos abertos também traz satisfação.
Vamos viver cada minuto com uma respiração
Um cronômetro malfeito de um tempo sem questionamento.
Vamos acreditar que um metro não é abismo
Que palavras não são grilhões.
Vamos prometer que não se pensa o mal quase nunca.
E nem se procura explicação.
Vamos viver em harmonia
Na crença cega de que o tempo não volta
Nem em pensamento, nem em indagação.
Vamos brincar de sonhos,
Acordar sorrindo,
Inventar histórias,
Viver em mundos paralelos
E fazer de conta que nada e que tudo passou.
Vamos programar beijos,
Selar acordos, ensaiar abraços, esperar sorrisos, criar expectativas
E dormir fartos de preparação.
Vamos viver intensamente
Sabiamente
Meticulosamente
Em busca, quem sabe? Da (im)perfeição.