GALAXY CURTO

não fumo, mas

um cigarro traz

um certo verniz

a fumaça sob o nariz

uma coisa de cinema

de herói de poema

todo enigmático

quando não sorumbático

detrás da fumaça

num banco de praça...

não fumo, porém

quando alguém

me pede o fogo

entro no jogo

e caço isqueiros

pelo corpo inteiro

mas como não os tenho

com ardiloso engenho

desvio a conversa

com olhinhos faceiros

de gato persa

não fumo, logo

a algum santo rogo

que não me atices

com essas tolices

de acender e pipar

e depois apagar

pois posso querer

também acender

e, uma vez aceso,

não se controla o desejo

não fumo, pois

o que vem depois

me desconsola

uma dúvida me assola

se eu morrer jovem

antes de ser pleno homem

quanto da vida não perderei?

quantos amores não enterrarei?

prefiro a abstinência

à me entregar aos zelos da ciência

não fumo, mas

sei que um cigarro traz

uma estranha sedução

um movimento de mão

um certo poder...

quem não queria ser

um detetive noir

uma diva de pegnoir

na combinação divina

de café e nicotina?