É DIA

É dia.

A noite me diz que é dia.

É dia de aleivosia.

Dia de, sendo infiel,

destituir a família.

Vejo no tempo que é dia

de malbaratar a vida.

Dia de usar qualquer faca

para matar a vizinha.

É dia

de alarmar o novo clima

que se desenhou no espaço

pela floresta invadida.

É dia.

Dia de infância crescida

fora do tempo, perdida

pela libido incendida.

É dia.

Dia de falsa alegria.

Dia em que festa na praia

pode trazer alergia.

Vejo sem tempo que é dia

de fabricar fantasia

com o alimento da filha

para pular na folia.

É dia

de malhar na academia.

Dia de cuidar do corpo

deixando a alma vazia.

É dia da biologia

descobrir espécie extinta

na lagoa poluída,

descobrir nova doença

em uma lata de ervilha.

Morcegos dizem que é dia.

Dia de nova doutrina

para escrever nova bíblia

com a nova tinta do dia.

É dia.

É dia da medicina

fazer profunda pesquisa

e desmentir a vacina

que salvaria esse dia.

Vejo no escuro que é dia

de roubar a própria tia

porque tem festa na esquina

vendendo boa bebida.

Vejo na rua que é dia.

Dia de ação libertina,

que a prisão já foi vencida

e a escravidão abolida.

É dia sem tempo. É dia

de conferência arredia

procurar nova saída

para o planeta sem vida,

para o planeta sem dia.

É dia.

Dia de pornografia.

Dia de usar qualquer via

para matar fantasia.

Vejo, portanto, que é dia,

que é dia de nostalgia.

Dia de chorar os dias

que não cabem nesse dia.

Dia sem alegoria.

Dia sem nenhuma rima.

Dia que mostra no espaço

a própria sina do dia.

A coruja diz que é dia.

Dia de atenta vigília,

que o gato subia na pia

e o juízo se anuncia.

É dia.

Dia de esperar o dia

que acabará com esse dia.

Kleiton Muniz
Enviado por Kleiton Muniz em 14/07/2013
Código do texto: T4386058
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