O PRÊMIO
I.
Um traço
E com as mãos eu faço
O rascunho do apogeu
Um traço
Sem métrica, réplica, compasso
Um traço que traço
O insumo, o bagaço; o futuro
Sonhado meu
Prefiro a pena do livre traçar
Ao determinismo liberal das teclas
Suspiro em ditongo quando nem sei o que é hiato
Mas pressinto o vazio que me falta uma folha
Quando me fala a ideia e a ideia escoa
Não vejo palavras em telas
Apenas papel ou cartaz em cartolina
– a propaganda é a desalma do fracasso
– o ferro que fere nem sempre se faz destemido
– desgosto e você: tudo a ver
Amarro minha distância ao espelho
Verei quem sou nada, se o traço me falha, se me oponho aos negócios...
Não vejo homens por trás da história: há mulheres ao lado dela.
Caminha ao meu lado a minha companheira,
Planeja que não será posse de homem algum.
Por trás de um grande homem há sempre uma história mal contada.
Um traço é um traço. Um risco é um risco. Mas sobre o céu, conte-me o que sabe.
Quanto mais escrevo linhas, mais minhas ideias apagam.
Sonhei formar um clã, depois um castigo. Tramei fazer castelo, depois sem amigos. Pensei tomar posse, depois perdi os anos.
Aprendi a ver homens colocando fatos na história. Depois aprendi que aprender estava errado.
E não soube errar mais, pois menos que seria eu um feitio do tempo,
Um templo das horas, menos que seria eu um a menos,
Ou a mais,
Por mais que ninguém ofereça conselhos sem antes merecer um conselho,
Falamos em semelhança: a quem me assemelho,
O que assimilo:
– a isso ou aquilo,
O princípio deu nisso,
Bastante é o infinito,
O traço que habito é um gesto só meu.
E quando escrito, traçado, dividido,
É meu, é seu, é um vento partido
Entre quem, por surdez ou no grito,
Prefere rasurar o ainda não dito
Agarrado ao passado que nem foi prescrito
Pra sanar o futuro, que é um sonho encardido
Como não fosse o futuro um fato levado com as próprias mãos.
Um prêmio, uma decisão:
Acordar sem dormir no futuro sonhado,
ou
Traçar sem rascunho e errar com paixão.