MIRAGENS

Agora já não tenho pressa,

vou fazer o meu tempo

e sentir a brisa

soprando no rosto,

brincando com meus cabelos grisalhos.

Tempo para sentar

no banco da pracinha,

e deixar que as miragens do horizonte

recordem meus dias.

Uma viagem

sem arrependimentos,

sem saudosismo,

apenas um viajar

de boas lembranças.

Poderia lembrar

das cibalenas de mamãe,

poderia lembrar

do mercúrio nos machucados de papai.

Das minhas bolas de gude,

das caixinhas de lápis de cores,

das canetas tinteiras,

dos pacotes de pipoca doces

com figurinhas,

muitas delas ainda estão coladas

no fogão de lenha

aposentado e sem uso.

Viajar pelas miragens do tempo

é uma arte.

Não devemos deixar

que as tempestades ofusquem

todo o deslumbramento

de um arco-íris.

Nem sentir-se diminuído

se nos contam

das maravilhas de Katmandu,

e nunca fomos muito além

daquela esquina.

Nunca se entregue as miragens

do que poderia ter sido,

elas são capazes de machucar

e de fazer doer.

Não pragueje

contra amores impossíveis,

deixe-os quietinhos

num mirante do teu coração.

Praguejar por amor,

também machuca

e faz doer.

E não existem cibalenas

para estancar esse tipo de dor,

não existe mercúrio

para cicatrizar esse tipo de ferida.

Está escrito:

Um dia,

no tempo e no espaço

todos nós seremos

apenas uma miragem.