Tela: Georgia O'keeffe


                    CANGA


        Minha canga, minha cabeça,
        couraça de fios, de raças,
        de cordas, de linhas,
        feixe de  córneas, lumens
        e agouros...
       Guardo aí dentro as marcas cinzeladas
       do couro, os riscos do arco-íris,
       os desejos, os solfejos da sanga.
       A luz trespassa meus cabelos de olhos de milho.
       Me sinto as vezes verde, 
       floresta sem trilha.
       Outras, em noites de argila,
       minhas palhas se mumificam
      e os pássaros professam ninhos,
      nessa concavidade sepulcral,
      onde passeiam as formigas e os 
     insetos rastreiam ermidas,
     sob essa ossada vegetal.
     Ah, que eu habito essa cripta,
     e bem que sempre daí ouço
     o sibilar dos regatos... 
      murmurante ancestralidade!


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