Comboios II
Vou de viagem.
E por mais bagagem que eu leve, mais ainda cabe na minha sacola.
Não sei qual tempo é meu ou qual espaço me cabe.
Só sei que estou vivo e participo.
Eu, mais uma horda de moleques,
A atirar pedras e correr por cima dos muros.
Todos sujos de infância.
Num tempo que não havia treta e todo mundo era rei.
Ê boi, ê boi da cara preta, pega esse menino,
Traz pra desfilar pela avenida,
Com o pé descalço e o samba na ponta da língua.
A banda passa e eu sigo.
Que venham a mim todos os bancos de praça,
Todas as moças esperando nas janelas,
os amores clandestinos,
Todos os becos escuros em que se faz escondido.
Venham até mim os desajustados,
Os que não se encaixam nos padrões.
Que chegue a mim o fogo de todas as paixões;
Venham ter comigo em comunhão.
Eu tenho o sentimento urgente,
A vontade maior
De fazer mais.
Por você, por mim.
De ser gente.
E ser tudo.
O que o mar traz a praia
e o que calmamente descansa em seu fundo.
Por isso, antes de morrer, flutuo.
A espuma do tempo e a existência asséptica.
O lado oculto da lua e o que eu desconheço de mim.
O que mais devo levar, se existir é apenas crer?
Danço, porque ouço a música.
Afinal,
O que é carnaval e o que é vida, senão a mesma coisa?
Maravilha.