INFÂNCIA EM VERSOS
Observações: este poema, eu fiz como base para o meu primeiro livro (experimental e em substituição ao TCC), no qual utilizei uma nova forma de representação e transformei a história de infância do autor Graciliano Ramos, em versos, fazendo uso dos capítulos "Escola" e "D. Maria" constantes em sua obra "Infância". Espero que gostem.
INFÂNCIA EM VERSOS
“... A preguiça, chave da pobreza...
assaltava-me, às vezes um desassossego...
exercício penoso.”
“Vozes impacientes (...) transformavam-se em gritos,
furavam-me os ouvidos;
as minhas mãos suadas, se encolhiam,
... nas palmas, o rigor das pancadas...”
“(...) as duas consoantes inimigas: d t”
Esforçava-me para esquecê-las...”
“(...) Fala pouco e bem: “ter-te-ão por alguém”- não me explicaram isto(...)”- também
Mas, “Quem era Terteão?”
Os livros me deixavam assustado
“Meu pai era o culpado” (...)
muitas vezes havia me insultado”
“Excedera em punições, por causa de duas letras.”
“Desejava enganar-se e enganar aos outros”
Dizendo: “produto meu”
Eu via em seu rosto
Mas “... os sustos esmoreceram, vieram receios diversos”
“... alguma coisa se havia alterado aqui dentro”
“Pouco a pouco mudei”
E mudei “pra dentro”, aqui, bem perto
“... iam cicatrizando as lesões causadas pelo alfabeto”
“De fato, estavam apenas adormecidas, (...)
às vezes a carne se contraía e rasgava
o interior se revolvia”
“Desânimo, covardia”
Escola não!!!
Eu temia
E “a notícia veio de supetão”
“A escola era horrível”
Sabido lugar “pra” rebeldes
“... e eu não podia negá-la,
como negara o inferno.”
“... eu me comportava direito: encolhido e morno, eu deslizava como sombra”
Que injustiça!!!
Escola não!!!
“O exílio entre paredes escuras”
Por que mereço a prisão?
“Não me defendi,
não mostrei as razões que me fervilhavam na cabeça,
a mágoa que me inchava o coração.”
Não resisti.
E segui, com o coração na mão.
Os sapatos novos não me apertarão,
Metido na roupa nova de fustão
Preocupado:
eu não saberei explicar “Terteão”.
“... e resignado, res infeliz
antevendo o matadouro.”
E, lá, no matadouro...
“Na Rua da Palha”
(...) numa sala pequena, uma senhora
baixinha, gordinha...”
“... As minhas mãos frias...”
A voz que sussurra docemente
É Dona Maria!
Outro, igualmente, a escola temia
“... Seguro por dois homens. Resistia,
debatia-se, mordia”
“... Foi difícil subjugar o bicho brabo,
sentá-lo, imobilizá-lo...”
Que inveja, eu sentia!!!
E, embora eu quisesse, jamais o faria.
Agora sentado, tenho o corpo inspecionado
“... a roupa, o couro cabeludo, as unhas e os dentes”
E muitas letras pela frente.
Mas, ah, Dona Maria!!!
“... a voz mansa(...), a mão curta a virar a folha,
o vestido claro e limpo,
tudo me seduzia.”
Aquilo me bastava e um pouco me tranquilazava.
Mas aqui dentro, nada mudava.
“No íntimo julgava-me fraco”
Papai e mamãe convenceram-me disto.
Segui contido, sofrido calado,
Sozinho, perdido, acanhado.
Por sorte Dona Maria tinha alma de criança
E rara severidade.
Nunca usou a palmatória
E sempre a pacividade
Ensinava-me passo a passo, o manejo da caneta...
“Olhava os estragos com desânimo,
procurava atenuá-los debalde”
Mas, Dona Maria não descuidava,
E minhas orelhas, ainda olhava.
“Aconselhou-me a tratar delas cuidadosamente”
Quase morri de vergonha.
“À noite, dormi pouco”(...)
levantei-me cedo”
Por uma hora inteira
Lavei-me, esfreguei-me
Até deixá-las roxas,
E em uma semana
Esfolá-las todas.
“a professora (...) segredou-me
que deixasse as orelhas em paz”
“Desobedeci”
Agora é tarde demais
Virou hábito...
Outra vergonha nunca mais!!!