O POETA É UM FINGIDOR

                                   "O poeta é um fingidor.
                                    Finge tão completamente
                                    que finge que é dor
                                    a dor que deveras sente."

                                                          Fernando Pessoa

O poeta é um fingidor
que finge a dor
para poder descrevê-la
de um jeito bonito.
O poeta cria a mulher amada
como se fosse um conflito,
para transformá-la na estrela
única da eterna madrugada.

O poeta, de tanto fingir,
finge a si mesmo,
como se fosse amante
e vai se iludindo a esmo,
perdido em lúdicos dizeres
de sonhos, promessas e prazeres
impossíveis. Tenta existir
em alma frágil e inconstante.

Mas há que se perdoar a mentira
do poeta. É ela que mitiga
a desesperança da dor sincera
do apaixonado. Dá razão à espera,
sublima perdas, recua, considera,
desaloja a tristeza antiga
e resgata a paixão que existira.

É inocente do poeta o fingir,
senão antes uma pueril tentativa
de parecer um pouco mais real
na própria loucura. Um ser normal
atormentado pela alma cativa
do pensar e o coração do sentir.

O poeta é um fingidor
que finge o amor
para poder senti-lo
de um jeito mais intenso.
O poeta recolhe da vida
o drama em grande estilo
e torna-o mais vivo e mais denso
do que pode ser qualquer despedida.

O poeta também é autor
que resgata a essência da flor
no coração da mulher escolhida
e não reluta em deixá-la
partir em busca da fantasia,
pois, se o amor é chegada e partida,
é no perfume que a flor exala
que se encontra a razão da poesia.
Nelson Eduardo Klafke
Enviado por Nelson Eduardo Klafke em 26/03/2012
Reeditado em 25/07/2014
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